sábado, 13 de junho de 2009

O Grande Erro Raiz


Maio de 2007


Erro Raiz é pensar, falar e se comportar como se o mundo viesse para nós e não de nós!

Geshe Michael explica no Yoga Sutra - “A Mãe leva seu filho ao cinema. Na tela um homem maltrata um cachorrinho. A criança chora e quer parar o homem. Quem sabe a criança deseje tocar a tela para tentar bater neste homem? Mas, isto não vai parar o homem, porque não tem nada a ver com ele. E a criança irá ferir sua própria mão neste processo”. No percurso de um dia inteiro nossa mente vaga através de objetos externos, imagens internas ou pensamentos. A mente dá voltas, o que significa que equivocadamente distorce as coisas.

Nossa mente comete este mesmo tipo de erro, todos os dias. Em todos os momentos de todos os dias. Precisamos parar este erro, isto é, primeiro entender como se processa a realidade intelectualmente. Nossa dor é real sim e honestamente fere as pessoas. Mas, somente poderemos parar esta dor se entendermos de onde ela vem. Isto, os *Votos nos ajudarão a perceber. Mas, a não ser que entendamos verdadeiramente as coisas - a não ser que entendamos como o mundo realmente funciona, qualquer percepção ou imaginação que tenhamos, será infectada pelo Grande Erro Raiz. A mente que possuímos agora é infantil, enganosa e distorcida, no entanto, infelizmente, zelamos tanto por ela que nos custa vidas e vidas cumprir os Votos! Este engano é o que causa toda a dor no mundo, que nos faz adoecer, envelhecer e morrer.

Até percebermos a *Vacuidade diretamente no *Caminho da Visão, tudo em nossa vida faz parte do Grande Erro Raiz. O dia mais importante em nosso caminho espiritual é aquele no qual pela primeira vez paramos esse Erro Cruel. Deixamos de ver as coisas de forma incorreta. “A criança entende que o vilão não está realmente na tela do cinema”.

- De onde vem esse Grande Erro Raiz? Vem de inúmeras vidas passadas. Chama-se erro raiz porque dá origem a todos os outros. É impresso em nosso contínuo mental e ali se mantém por acreditarmos que as coisas existem intrinsecamente, por seu próprio lado – que tudo seja auto-existente sem qualquer interferência de nossa mente. Então, a partir desta visão incorreta achamos que algo realmente existe, define e determina. Pensamos que todas as coisas, pessoas e situações sempre começam, acontecem e funcionam por si mesmas. E, devido a esse obscurecimento mental que trazemos conosco desde antes do nascimento, o DNA de nossas sementes mentais, não percebemos que as coisas, pessoas e situações não começam, não funcionam ou acontecem sozinhas. Cremos que têm existência própria e nos agarramos a esta esperança inválida. Portanto, esse erro provém de não termos suficiente compaixão e humildade para perceber que erramos o tempo todo.

- Como sair desta armadilha preparada por nossas próprias sementes mentais viciadas no grande erro raiz?
- Todos os objetos e sujeitos de nossa visão fanática desejosa, raivosa ou apegada, em algum momento vão partir nosso coração e nos estressar. Compreendendo a Vacuidade (antídoto para o erro raiz) através da compaixão com a qual cuidamos de todos, é o que extinguirá as sementes mentais negativas acumuladas por classificarmos como auto-existentes as meras aparências percebidas por nossos sentidos.

Sentimentos, intensas emoções, descriminação, etc, surgem a respeito das coisas que pensamos ver, – “e a criança golpeia com seu punho o vilão na tela do cinema”. Como diz Geshe Michael, “até mesmo esta caneta em minha mão não é uma caneta, isto é o correto. Mas, no fundo do meu coração, tenho a sensação que é uma caneta o que seguro porque me pertence, porque a encontrei na loja e porque a comprei. Todas essas idéias sobre minha caneta são incorretas. Só existe um cilindro o qual por minha virtude acumulada posso denominar caneta e usá-la para escrever preces aos seres. Não há canetas que existam pelo controle de minha mente ou fora dela, como o vilão no filme”.

Exceto a Vacuidade, absolutamente todos os dharmas estão contidos nos *5 agregados onde estão os 5 sentidos. Eles possuem as próprias marcas que criam causas e determinam condições para todos os acontecimentos, pessoas e coisas em nossas vidas.

Como disse Huang Pó:
"Os Tolos rejeitam o que vêem e não o que pensam, os Sábios rejeitam o que pensam e não o que vêem".

- Como este erro se processa em nossa percepção e comportamento?
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Por causa desse erro raiz geramos as falsas esperanças, as expectativas infundadas, as quais mantêm nossa percepção errônea. Formamos a partir daí nossas idéias e conceitos equivocados. Através desses conceitos inválidos começamos a trazer para nossa mente suposições e certezas erradas sobre as pessoas, coisas, situações e caminhos, que nos obstaculizam e criam os padrões habituais de pensamento e comportamento.

Nossa mente começa a se apegar naturalmente ao conceito que fizemos sobre as pessoas, coisas e situações, sem notar que apenas seguimos nosso padrão enganoso... Devido a esse apego, sem saber, criamos uma atitude mental infrutífera, pois nossos pontos de vista estão errados. Esta visão incorreta, primeiramente, causa as aflições mentais (ignorância do EU, apego e desejo, aversão e raiva, orgulho e avareza, medo, ciúme e inveja). Funcionamos e nos relacionamos através dessas aflições mentais que atraem todos os obstáculos que impedem nossa liberdade e felicidade nas parcerias, e nos mantém acorrentados no samsara em ciclos repetitivos de vida e morte sem satisfação real.

Até o dia em que percebamos a realidade última, nossa vida seguirá guiada pelo erro que nossa mente repete indefinidamente, distorcendo as coisas. Achamos que estamos certos e que o outro é quem errou, sentimos que somos injustiçados, mal pagos, tratados com grosserias e desrespeitados. Achamos que a caneta é caneta por si mesma... “Até que a criança veja as coisas como realmente são, se lançará contra o vilão na tela, ferindo a si mesma e às suas mães”. Isto é... não é o parceiro, o chefe, o governo, os empregados, os amigos, a família, os filhos, os pais, o guru, o dharma ou a sangha..... somos sempre nós! Nossas sementes voltando fermentadas. Não adianta lançarmo-nos reagindo mal contra o retorno de nosso karma porque machucaremos mais ainda aos outros e a nós. Temos que cuidar bem de todos mesmo que nos tratem mal. Assim começamos a parar a roda da nossa dor e abrimos espaço para o filme de vida que desejamos assistir.

* Vacuidade - O verdadeiro funcionamento do mundo, de nossa vida e mente. Nada existe sem a interferência de nossas sementes mentais, que por sua vez dependem da maneira como tratamos todos os seres.
* Vacuidade, Votos, Caminho da Visão e Agregados – vide ensinamentos específicos no blog


Treinamento EspAcial



Lama Gangchen chama a prática da percepção da vacuidade, que é a visão correta ou verdade absoluta, de Treinamento Espacial.
Paralelamente, a física quântica tem demonstrado que somos puro espaço, que nada toca em nada, que somos espaços que se relacionam com outros espaços sem percebermos isso.

Ele ensina que o problema causador dessas visões equivocadas e incompletas é a identificação com nosso ego, e os vícios químicos internos que o seguem. Esse ego nos dá a sensação que somos permanentes e sólidos, que é o terrível engano de apostar no constante "eu existo", "eu sou", "isso é meu", "meu isso ou meu aquilo". Fruto do agregado do Sentimento, onde nos baseamos na afirmação/sensação/descriminação - "eu sou, logo existo e portanto possuo" que desencadeia o auto=apreço, a possessividade e a nociva auto-importância. Depois repassamos essas informações às nossas células que repassam à cadeia de neurônios e neuro-transmissores e daí a enorme teia de acontecimentos desfavoráveis aparece na tela de nossa vida, doenças e morte.


Na física quântica todas as possibilidades estão acontecendo simultaneamente, mas quando focalizamos a atenção sobre a natureza das coisas, somente uma possibilidade pode ser concebida como real para que possamos experiência-la. Para o budismo a realidade é vazia de existência intrínseca, está acontecendo interdependentemente e pode ser observada de modo relativo-enganoso ou absoluto-vazio, sempre na qualidade da mente do observador. Na verdade a realidade só é percebida se houver alguém que a perceba, de outra forma nunca está aparente.


Para a física quântica somos considerados apenas como tendências. Já o Budismo diz que somos Budas futuros desempenhando atualmente apenas o papel de nossa capacidade mental presente; porém qualquer que seja a nossa realização, será sempre vazia de existência por si mesma. Se interpretarmos essas tendências quânticas como a tendência à iluminação; física e budismo retratam o mesmo alvo. Porém, a física quântica e os cientistas não relevam a espiritualidade como fonte, caminho e objetivo. Eles chegaram quase a mesma conclusão dos sábios sagrados, mas não interpretaram a natureza última da realidade, porque seus esforços foram dirigidos ao mundo externo. Com a grandiosa capacidade que possuem, se levarem a mente de busca utilizando o ilimitado universo interior como base, chegarão às mesmas conclusões dos mahasiddhas - grandes realizadores.


Encontrar o ilimitado espaço interno é o Treinamento Espacial de nossa viagem mais correta, porque o mundo externo é simplesmente uma projeção do mundo interno. Questionarmos sobre como exercemos nossa vontade, desejos e planos aplicando a paz interna fará com que encontremos mais espaço e cada vez mais paz interna e externa. Se pesquisarmos nossos ambientes mentais e emocionais, nossas crenças, ardis e álibis, chegaremos à conclusão que tudo é infundado e limitante por nossa própria maneira de pensar e agir, e não por causa do mundo lá fora. Precisamos agora mesmo abandonar a mente infantil, validar nossa existência humana e merecer a condição do vir-a-ser um ser sagrado projetando um mundo externo, bom para todos!


Compilado de ensinamentos orais de Lama Gangchen em Maio de 2000 e Julho de 2002


segunda-feira, 8 de junho de 2009

O que é Dharma e o que não é Dharma


"Naquele que quer livrar o mundo das muitas causas de cada sofrimento,será preciso gerar o Pensamento da Verdade Última e jamais se empenhar em retroceder"

A pessoa espiritual é aquela que percebe, requalifica e faz, levando em consideração os possíveis resultados de qualquer pensamento, palavra e ação, internamente e nas pessoas. Porque a motivação da espiritualidade a faz saber que algo para ser espiritual e ser Dharma, causa maior benefício interno que externo, sempre.

Tudo que ajuda à libertação do Samsara é Dharma. Tudo que prioriza mais o caminho da visão correta dos fenômenos é Dharma. Perceber a diferença entre o que nos prende ao samsara e o que nos liberta é dharma. Aquele que se preocupa mais com o seu interior e o interior de todos os seres está praticando dharma. Portanto, Dharma pode ser muitas coisas, objetos, sujeitos, situações e não apenas a doutrina do Buda.

Com motivação correta e aplicação do karma e vacuidade tudo se torna dharma e causa para a Iluminação.